sábado, 18 de outubro de 2008

Crise

Outro dia estava participando de uma discussão sobre a queda da bolsa de valores e as conseqüências devastadoras que vem trazendo à economia mundial. Na volta pra casa parei pra calcular o estrago que a minha crise financeira vem causando em minha vida.



Quando era mais nova era muito segura quando se tratava de dinheiro. Entrei na faculdade, consegui um estágio onde ganhava 260 reais e com esse dinheiro pagava minhas pequenas contas e saia com meus amigos de vez em quando. Depois me mudei para um emprego e com um salário melhor. E a partir daí vieram os cartões de lojas, cheque especial e um pouco mais tarde os cartões de crédito.


Na época em que comecei a usar meu especial, que era bem pouco, conseguia cobri-lo todo mês sem nenhum problema. Então logo aumentaram meu limite e comecei a gastá-lo. Todo. Lembro-me da primeira vez que usei meu cartão de crédito. Foi pra comprar um bota de couro que já estava namorando há alguns meses e o resto da história vocês já sabem. Só que um belo dia descobri que não tinha como saldar minhas dívidas dos meus dois cartões então comecei a pagar o mínimo, quando conseguia pagar, e essa dívida vem virando uma bola de neve que está prestes a me atropelar.


Foi quando percebi que havia alguma coisa estranha. Os bancos que antes se estapeavam pra que eu adquirisse algum dos seus produtos não me procuravam mais. No início achei ótimo, mas eu sabia que tinha algo errado nisso tudo.


Então estava em casa tranqüila, num dos raros momentos em que não estou fazendo nada e eis que toca o telefone. Do outro lado da linha uma daquelas atendentes com aquela voz tão amistosa e que todos nós adoramos ouvir. Disse que era da central de relacionamentos do banco e que havia verificado que constavam débitos em meu nome e me perguntou o porquê de eu não estar pagando e quando eu iria quitá-los.


Se eles perceberam bem, puderam constatar que estou praticamente falida. Dá pra ver que eu não estou rasgando dinheiro e que não estou fazendo nenhum tipo de manifestação anticapitalista usando o dinheiro deles como forma de combate à hegemonia das grandes organizações na sociedade. E como minha resposta era óbvia resolvi omiti-la, disse qualquer coisa e a querida atendente obviamente também não ficou satisfeita e vem me perseguindo desde então.


Mas agora já estou com minha fala pronta pra da próxima vez que ela vier a ligar pra mim:


-Alô!
-Boa tarde. Gostaria de falar com a Sra. Daiane.
- Pois não, é ela quem está falando.
- Sra. Daiane , eu sou da central de relacionamentos ao cliente e estão constando em nossos cadastros débitos referentes a produtos que a senhora adquiriu conosco. A senhora confirma essas informações?
- Sim, confirmo.
- Gostaria de estar sabendo quando a senhora estará saldando esses débitos e porque a senhora não pagou nas datas certas de vencimento.
- Então. Estou esperando que um meteoro se colida com a Terra e extermine toda a raça humana. Já que não iremos mais existir então ficarei isenta de pagar qualquer coisa a qualquer pessoa. E se resistirmos, teremos que conviver com uma camada de poeira escura e densa que impedirá que as pessoas consigam se identificar. Então provavelmente vocês não me acharão mais. Espero ansiosamente por isso.

É certo que não farei isso porque no fim das contas eu estou errada e a atendente apesar de ser irritante nem tem nada a ver com minhas dívidas. Sei que vou conseguir acabar com isso até no fim do ano, mas também não vou ter dinheiro nem pra comprar uma bala na mercearia. Decretei fim ao meu Carnaval em algum lugar paradisíaco ou minha viagem de mochila pela América do Sul, mas pelo menos vou dormir tranqüila.

O mais engraçado disso tudo é que hoje recebi uma outra ligação do banco é desta vez foi totalmente diferente das usuais. Um rapaz com a voz de Johnny Depp perguntou se a Daiane estava. Eu logo imaginei que seria de algum banco porque um rapaz com a voz de Johnny Depp nunca ligaria pra mim as onze da manhã, mas afinal é o rapaz com a voz de Johnny Depp então nem poderia deixar de atende-lo.

- Bom dia poderia falar com a Daiane?
- Pois não, é ela quem fala.
-
Poxa como deve estar aproveitando muito esse calorão hein!

É nessa parte que eu fico confusa e até chego a pensar se poderia realmente ser meu rapaz com voz de Johnny Depp. Óbvio que não! Mas continuando ele pergunta:

- Você mora no Rio ou em Niterói?

Então eu caí na real e percebi que não era o Johnny Depp, realmente lamentável. Ele faz parte de uma nova geração de atendentes que está mais preparada pra atender um público “jovem” e parece ter tomado alguma sopa alucinógena. Adorei!

- Não moro em nenhuma das duas, sou de Volta Redonda.
- Ahhh Volta Redonda! Mas aí deve estar calor também né!
- Está sim.
-
Nós agradecemos você estar no nosso banco e estamos muito satisfeitos por isso. (????) Então Daiane, você costuma economizar dinheiro?
- Eu não. Nunca.
- Nunca? Sério?
- Aham.
- Poxa eu também não consigo juntar dinheiro. Mas Daiane eu te liguei porque tenho uma ótima proposta pra fazer pra você. Nós do banco estamos fazendo uma promoção e convidando somente alguns correntistas para adquirirem uma poupança onde você pagaria todo mês um valor bem reduzido.
- Filho eu estou falida.
- É??? Poxa eu também tô falido!! (???)
Então ele faz uma pequena pausa e eu fiquei com cara de pamonha esperando ele falar mais alguma coisa e ele continuou:

- Foi mal. Eu espirrei! Mas continuando, tenho certeza que você faria um ótimo negócio porque além de você conseguir juntar dinheiro pra fazer aquela viagem de final de ano você vai concorrer a vários prêmios.
- Faz o seguinte então. Me ligue o ano que vem quando eu acabar com as minhas contas que eu faço essa tal poupança.
-
Mas Daiane essa promoção é somente pra alguns correntistas e nem sei se vai ter depois. Por algum motivo somente alguns estão nessa lista e você está entre eles.

Nessa hora realmente tive certeza que ele tinha tomado alguma coisa. Uma vez o banco me ligou dizendo que eu fazia parte de uma tal de lista CV, que é uma coisa ruim, mas nem sei exatamente o que é. E hoje eu devo estar entre os Top 10 dessa lista. Provavelmente ele trocou a lista dos clientes em ascensão por esta lista CV e como eu era uma das primeiras do ranking, logicamente imaginou meu futuro promissor e que eu iria querer depositar 500 reais nessa tal poupança ou então ele achou que estava no mundo dos duendes saltitantes e pegou a primeira lista que tinha na frente. Pelo nosso ótimo papo tenho quase certeza que é a segunda opção. Então quando o coitado deu por si que eu não tinha dinheiro mesmo, nem moedinhas pra colocar no cofrinho se despediu de mim e agradeceu pela atenção.

No fim das contas ele me passou confiança e eu tivesse algo pra investir com certeza investiria nessa tal poupança psicodélica.

Só sei que com a experiência que adquiri consigo identificar um atendente de banco antes dele falar a primeira palavra e já que estou numa recessão sem fim e que todo mundo hoje ganha dinheiro com tudo penso em dar consultoria e palestras sobre isso. “Como dispensar gentilmente um atendente em dois segundos sem desligar o telefone na cara dele e sem xingar sua mãe”. Depois escrevo um livro e ficará faltando somente a árvore e o filho.

1 comentários:

Anjinha disse...

hahahaha, adorei Dada... muito bom... só vc p/ ter uma resposta dessa... mas cá p/ nós, só de ter a voz do Johnny Depp ja valeu a pena a conversa não acha???

Bjinhus